Criar a fagulha por um novo movimento estudantil

Por Carlos Lopes, Juventude da Alternativa Socialista – LIS, Brasil.

O 12 de setembro foi marcado por manifestações pelo impeachment puxadas pela direita liberal, que contou com a presença de alguns setores de esquerda. Com atos esvaziados e sem a participação de setores populares organizados, foi um fracasso. Apesar disso, uma polêmica rondou a data. A presença da UNE (União Nacional dos Estudantes), entidade dirigida pela UJS, juventude do PCdoB. Bruna Brelaz, eleita presidenta no Congresso Extraordinário realizado em julho, foi a face mais visível da defesa da frente ampla no movimento estudantil. 

A UNE ainda realizou uma reunião da diretoria na véspera do protesto, em que deliberou que a entidade não convocaria para o ato. Não adiantou. No dia seguinte, lá estavam os diretores da UJS, entre eles Brelaz, trajando a camisa da UNE junto com o MBL e Vem pra Rua.

Mas, os fatos relembrados inicialmente servem para ilustrar a condução da principal entidade dos estudantes universitários da América Latina nos dias de hoje. Aparelhada, sem democracia interna e sem respeitar as decisões tomadas pelo conjunto da direção, a UNE não consegue responder os desafios à altura do que a juventude radicalizada, que sofre com a alta do desemprego e os efeitos do neoliberalismo, desejam. Quase 15 milhões de brasileiros sofrem com a falta de emprego nos dias de hoje, enquanto, por outro lado, os ricos ficaram US$ 5 trilhões mais ricos durante a pandemia. 

Os números não vem do acaso. São resultados das políticas apoiadas pela direita liberal que hoje, envergonhada, tenta se desvencilhar do monstro que criou. São também históricas, aprofundadas durante os governos Fernando Henrique, ex-presidente da República do qual Brelaz também se reuniu nos últimos dias no seu périplo pela “democracia”. O problema é que a democracia de Bruna, FHC e PCdoB não é a democracia do povo pobre. É a democracia da defesa abstrata das instituições, do voto e da domesticação da classe trabalhadora. 

Com o início do governo Lula (2003-2010), veio um novo período de arrefecimento dos ânimos. Como exemplo, a Reforma Universitária do presidente foi responsável por criar o ProUni e jogar rios de dinheiro para os grandes conglomerados privados da educação. O Reuni buscou expandir o número de universidades públicas, mas sem aumentar o orçamento da educação. Ainda assim, a UNE não titubeou em apoiar a Reforma sob o argumento de disputá-la. Aprovada e deformada ao final, o texto final foi considerado uma vitória para a entidade, marcando um recuo em posições históricas do movimento estudantil. Portanto, a tarefa de retomar a independência de classe e financeira não vem de agora.

Política e disputa interna 

Com a pandemia, como já dissemos, o último congresso foi extraordinário e feito virtualmente. Não contou com a inscrição de delegados e a nova direção foi eleita respeitando a proporção das forças obtidas no último CONUNE presencial, em 2019. Naquele ano, Iago Montalvão, também da UJS, foi conduzido à presidência. Na chapa da majoritária, além da UJS, estavam Levante Popular da Juventude, Kizomba, Reinventar (JSPDT), ParaTodos, MPJ em Disparada e Enfrente. A chapa da Oposição da Esquerda, campo do qual a Alternativa Socialista reivindica, ficou em segundo. Nela estavam UJR, Juntos, UJC, RUA, Afronte, Manifesta, Vamos à Luta, JCA, MTST, Brigadas Populares, Estopim, Círculos Populares e Pajeú. Em terceiro veio a JSB, juventude do PSB, que lançou chapa própria, assim como a Juventude da Articulação da Esquerda, última colocada.

Essa se mantém como a configuração do movimento estudantil hoje. A majoritária, com dois terços da direção (70,92% dos votos em 2019) detém um poder difícil de confrontar. Elegendo presidentes consecutivamente desde 1989, são 32 anos de um poder sedimentado com base na conciliação de classes e no pouco respeito à democracia interna.

Democratizar as instâncias de participação e organização gremial do movimento estudantil universitário é uma tarefa urgente. A mais ampla participação, respeitando a diversidade, fortalece o movimento que se organiza na defesa da universidade pública, gratuita e de qualidade. Ainda mais em tempos de reformas e ajustes antipopulares onde todas nossas conquistas estão em risco. Não se trata de um debate ideológico ou moral, se trata de um debate político estratégico. É hora de terminar com a UNE que funciona nas costas das maioria do movimento estudantil, é hora de recuperar a UNE para os estudantes e as estudantes, e colocá-la ao serviço da luta. 

Para isso, algumas bandeiras precisam novamente ser agitadas, e a UNE carrega um papel fundamental de organização dos estudantes que deve ser resgatado. A pandemia escancarou um problema crônico do Brasil: o pouco investimento em educação. A exigência dos 10% do PIB para a educação é histórica e urgente, para que cada escola e universidade forneça assistência estudantil digna, garantindo a permanência, melhores estruturas e um corpo docente qualificado. Barrar a lista tríplice para reitores, que abre brechas para que os votos depositados por alunos, professores e técnicos-administrativos sejam jogados no lixo. Nos últimos meses, já vimos o desrespeito com a não nomeação do primeiro colocado sob o governo Bolsonaro. Foram mais de 20 eleitos e não empossados sob o governo privatista e genocida. 

Por fim, tudo isso passa também por revogar a Emenda Constitucional 95, responsável por estabelecer um teto de gastos em diversas áreas, como saúde e educação, o que causa um desmonte em setores essenciais para o povo. Não à toa, a EC era apelidada de “PEC do Fim do Mundo” na época de sua votação no Congresso. Todos os desastres que vimos recentemente, como o corte de verbas nas universidades vividos principalmente em 2019 e 2021 e o esgarçamento do orçamento para saúde e pesquisa são efeitos diretos da Emenda. 

Somos juventude rebelde que não aceita o fato consumado, somos juventude rebelde que defende a universidade pública e vai pela ampliação dela. Para que cada vez mais pessoas tenham acesso, para acabar com a universidade de uns poucos, para enfrentar os ataques dos governos de turno, para defender o que é nosso, vem com a gente!