36 anos após sua morte. Nahuel Moreno: nossa homenagem

Por Guillermo Pacagnini – MST da Argentina e da LIS.

Nahuel Moreno foi quem lançou a pedra fundamental de nossa corrente histórica e, como todos os anos, o recordamos ao transmitir alguns de seus ensinamentos: um legado teórico e político de atualidade e utilidade para a construção do partido e da Internacional.

Moreno foi um dos mais importantes líderes trotskistas e, sem dúvida, o principal da América Latina. Reconhecido mesmo por seus mais ferrenhos detratores, teve o mérito de ser um dos poucos dirigentes que assumiu a tarefa de continuar o caminho de Trotsky após sua morte e em meio a um panorama político adverso, conseguindo estabelecer uma das principais correntes do movimento trotskista internacional.

Dedicou sua vida à construção do partido e da internacional sem deixar de se dedicar às esferas acadêmica e intelectual. Longe de qualquer culto a sua figura, destacamos as valiosas ferramentas que permanecem válidas para a intervenção na rica realidade atual, cheia de oportunidades para nos construirmos. Nossa homenagem também se concentra em transmitir às gerações mais jovens e enfatizar a militância como um todo aqueles pilares e alicerces sobre os quais, ao reformular e atualizar a teoria, o programa e a organização, construímos diariamente o partido e a internacional que pode levar os trabalhadores a tomar o poder e começar a construir o socialismo na Argentina e no mundo.

Confiança na classe trabalhadora

A marca genética que Moreno deu à nossa corrente é a confiança científica na classe trabalhadora e a necessidade de construir o partido em seu seio, intervindo em suas lutas e fazendo parte dele. Promover a democracia mais absoluta da classe trabalhadora e ganhar os melhores dirigentes e ativistas para contribuir para a construção do partido.

A classe trabalhadora, apesar dos altos e baixos, não parou de lutar durante décadas. Derrubou governos, derrubou regimes que foram entronizados durante anos e é isso que nos faz ter confiança em um mundo melhor.

Lutamos em todos os campos onde a luta de classes se expressa, mas estamos convencidos de que somente a classe trabalhadora mobilizada pode derrotar o poder do sistema capitalista-imperialista.

Sem dúvida, juntamente com a tradição e a moral, a confiança na classe foi o que permitiu nos construir sem ceder a fenômenos de massas que atraíram a vanguarda. Tais como a conciliação de classes promovida pelo peronismo, o foquismo guerrilheiro ou a crença de que a democracia burguesa dos primeiros tempos de Alfonsin iria resolver todos os males. Foi o que nos permitiu não sucumbir aos cantos de sereia do neo-reformismo, do possibilismo e das variantes kirchneristas, como infelizmente um setor que afirmava ser de esquerda fez.

Quando a campanha de “o socialismo fracassou” ocorreu, muitas correntes de pensamento desistiram de reconhecer a classe trabalhadora como o sujeito da revolução. Hoje, desde a crise do modelo capitalista, o papel da classe trabalhadora se mostra em toda sua força como sendo a matéria-prima fundamental para alimentar a construção do partido. Com esta ancoragem, nos posicionamos para intervir em todos os processos do movimento feminista, do movimento estudantil, dos bairros e das lutas ambientais, disputando a direção política e sindical.

Construir o partido dentre as massas

Moreno deu um enorme passo ao propor deixar a marginalidade em que se encontrava o trotskismo e construir o partido a partir dos processos. Lutando contra o sectarismo e também contra o oportunismo, ele procurou permanentemente que o partido se conectasse com o movimento de massas.

Construir dentro do peronismo operário durante o período da Resistência, intervindo no levante pós-Cordobazo – nas lutas e na abertura eleitoral, desenvolvendo a campanha contra o pagamento da dívida durante o tempo de Alfonsín e explorando confluências, sempre em linha com a estratégia de construção do partido. Foi assim que o trotskismo conseguiu se tornar uma força dinâmica e virar uma forte corrente enquanto outros setores oportunistas, uma vez fortes, desapareceram da história.

Lutamos para construir partidos revolucionários com influência de massas em nosso país e no resto do mundo. Apelando para as mais diversas táticas, para convergir com outros setores e disputar em melhores condições, mantendo sempre a independência política e organizacional de nosso partido. Nós reivindicamos o projeto leninista, de partidos de ação que são construídos nas lutas centrais do movimento operário e popular. Estamos apostando em formar um forte núcleo de quadros e militantes capazes de construir uma organização na qual milhares de trabalhadores, jovens e mulheres que abandonam os velhos partidos tenham um lugar, para contribuir na luta por um governo operário e popular que lidere a construção de uma sociedade socialista.

Hoje, as condições objetivas são mais favoráveis do que quando Moreno projetou as bases de nossa corrente, pois, embora o trotskismo não tenha se tornado uma corrente majoritária no movimento operário e popular, há milhões que, vendo e sentindo a tremenda crise do capitalismo, estão começando a percorrer o caminho da revolução e a olhar com simpatia para a esquerda revolucionária. Isto proporciona avanços de qualidade na construção. A experiência do desenvolvimento contínuo da Liga Internacional Socialista é um claro exemplo disso.

O internacionalismo

Moreno marcou como o salto fundamental em nossa história o trabalho político internacional. Porque o destino do movimento operário de um país está indissoluvelmente ligado à luta de classes a nível mundial. Grande parte de sua militância e a de nossa corrente contribuiu para a construção de uma corrente internacional.

A prática internacionalista nos ajuda a ser mais corretos na orientação política de cada país. Mas também porque sem uma organização internacional, por menor que ela seja, é impossível construir partidos nacionais e realmente disputar o poder. A revolução pode ter sucesso em um país, mas se não se espalhar a outros, pode ser derrotada pela contra-revolução mundial.

O imperialismo tem sua organização internacional. Para ter sucesso, nós trabalhadores também precisamos de uma organização mundial.

Moreno sempre salientou que o desenvolvimento de uma internacional não era um processo meramente evolutivo ou linear, mas que era necessário apostar em fusões e saltos. É por isso que ele não só fundou partidos, mas estava convencido de que também era necessário explorar a confluência com outros setores revolucionários, mesmo vindo de outras tradições. Esta é uma base que estamos retomando no projeto de construção de nossa internacional, tirando conclusões de experiências passadas, apresentando a necessidade de um reagrupamento de revolucionários.

É por isso que todas as energias que estamos colocando do MST na construção da LIS (Liga Internacional Socialista). Seu rápido desenvolvimento demonstra não apenas as possibilidades objetivas, mas também o lugar prioritário que o internacionalismo tem em nossa atividade.

Longe do dogmatismo

A elaboração permanente com espírito crítico e a partir da realidade é o outro aspecto do legado de Moreno que queremos destacar. Foi um profundo estudante do marxismo, o que não é encará-lo como um dogma e uma receita, mas como um método científico para continuar a se atualizar e melhorar de acordo com a realidade. Após a morte de Trotsky, houve eventos tremendos que o dirigente russo não poderia ter conhecido, como o surgimento de revoluções sem uma classe trabalhadora e sem um partido revolucionário. Havia setores do trotskismo que pensavam que não eram revoluções porque não se enquadravam no esquema que tinham.

Moreno, avançou em elaborações críticas em sua Atualização do Programa de Transição, o estudo das revoluções contra as ditaduras e a lei de inversão de causalidade, entre outros. Sem isso, seria muito difícil explicar muitos dos fenômenos que ocorreram após a Segunda Guerra Mundial. Nos encontramos em uma situação análoga diante dos imensos fenômenos que ocorreram após sua morte, como a queda do aparato mundial estalinista e agora a crise sistêmica do capitalismo e os formidáveis processos que ela está desencadeando. É por isso que apelamos para este método de ser crítico do próprio morenismo, resgatando sua essência a fim de avançar em novas elaborações nos campos teórico, político e organizacional.

A atualidade de seus ensinamentos

Estes ensinamentos são hoje pontos de referência chave, pois vivemos em um período de maiores oportunidades do que aquele vivido por Moreno. Novos fenômenos surgem diariamente para interpretar e intervir. O uso dessas ferramentas nos permitiu percorrer um caminho de novas elaborações.

Estamos iniciando um ano político com enormes desafios na construção do MST, da LIS e de todos os espaços unitários e frentes de atividade em que atuamos, como a FIT-Unidade. Percorrer este caminho com a maior energia militante é a melhor homenagem que podemos prestar ao nosso mestre. Continuaremos a lutar para mudar este mundo, convencidos de que o nosso objetivo não é utópico. A única coisa utópica, pura ficção científica, é acreditar que o capitalismo vai resolver qualquer problema. Portanto, a melhor homenagem a Moreno é continuar construindo o partido, a Internacional, e continuar acreditando na classe trabalhadora e na mobilização, e que um mundo socialista é possível e necessário. Moreno certamente nos diria para continuar lutando, porque não há nada nem ninguém para nos dizer que não podemos ter sucesso.