O furacão Bebianno

Até a manhã desta segunda-feira (18/02) os principais meios de comunicação traziam a notícia de que a tão esperada exoneração do ainda ministro da secretaria geral do governo federal Gustavo Bebianno (ex-presidente do PSL), ainda não havia saído no Diário Oficial da União. Desde o final da semana passada, a saída de Bebianno do governo tem sido dada como certa, e nos últimos dias, inclusive, chegaram a circular declarações suas na internet, nas quais se dizia “arrependido” de ter ajudado a eleger Jair Bolsonaro, e teria chegado inclusive a chamar o seu colega de partido de “louco”, e afirmado que ele é um “perigo” para o país.

 

Que Bolsonaro é um perigo para o Brasil, e sobretudo para a classe trabalhadora brasileira e os demais setores oprimidos, nós já sabíamos, e desde antes das eleições seguimos explicando isso de maneira. Sua política ultraliberal, suas concepções proto-fascistas e o seu oportunismo político só podem significar um terrível aprofundamento nos ataques aos direitos de trabalhadores e trabalhadoras, e um agressão à soberania nacional. Quanto à sua saúde mental, não há nada por hora, que ateste algum tipo de doença, e qualquer especulação nesse sentido só pode significar uma tentativa de tirar a sua responsabilidade sobre os seus atos, da mesma forma como fazem análises ingênuas ou rasas sobre sua suposta falta de inteligência, ou de habilidade política por conta do seu comportamento aparentemente simplório.

 

Se Bolsonaro não fosse no mínimo bastante esperto, e não fosse um político experiente – experiência que quase trinta anos de carreira política lhe deram – não teria deixado de ser o deputado federal insignificante que foi durante a maior parte de sua vida pública, para se tornar o presidente da República justamente em um momento em que o sistema político é rechaçado pela grande maioria da população, coisa que nenhum outro candidato conseguiu fazer, nem mesmo os setores mais “antenados” da esquerda e seus intelectuais “progressistas”, que gostam de viajar pela Europa em busca de “novas” alternativas políticas, mas que não foram capazes sequer de captar o sentimento geral que move a classe trabalhadora e o povo brasileiro neste momento.

 

A mais nova crise que abala o governo Bolsonaro, sem dúvida a maior até agora, e que começa a expor de maneira clara o verdadeiro caráter deste governo, tão corrupto quanto seus antecessores, começou com um bate-boca pelas redes sociais entre o ministro Gustavo Bebianno e o vereador pelo Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, um dos filhos do presidente. O motivo da discussão era o fato de Bebianno afirmar ter conversado com Bolsonaro sobre possíveis casos de candidaturas laranjas do partido nas últimas eleições, que foram divulgadas amplamente pela imprensa na semana passada. A tese defendia pelos filhos, era a de que Bolsonaro nunca havia tomado conhecimento destes fatos, e o ministro foi chamado de “mentiroso” por Carlos, que divulgou áudios de telefonemas do pai, e que em qualquer país com um governo sério este ato atentaria contra as leis de segurança nacional. Desde então, houveram várias reuniões entre Bebianno, Bolsonaro e demais integrantes do governo, e em um primeiro momento, levantou-se a possibilidade de que ele poderia ser mantido no posto, o que poderia ser interpretado como uma tentativa do governo de se preservar diante de possíveis declarações de Bebianno após sua demissão. Em outra declaração, via redes sociais, ele também deu a entender que se “caísse”, levaria Bolsonaro junto. Diante de tudo isso, já se fala até na possibilidade de a família Bolsonaro deixar o PSL, e reeditar a velha UDN (União Democrática Nacional), antigo partido da direita conservadora no período Varguista.

 

Sem dúvida, Gustavo Bebianno, enquanto ex-presidente do PSL, que liderou o partido durante a campanha eleitoral de Bolsonaro, deve ter muito o que falar sobre a eleição do atual presidente, quanto mais se forem comprovadas irregularidades envolvendo as candidaturas do partido, além de ter dito possuir “cartas na manga” a respeito de Carlos Bolsonaro. Independente das informações ou trunfos que Bebianno possa possuir contra o clã Bolsonaro, tudo o que o governo não quer nesse momento, é qualquer tipo de escândalo. Nos próximos dias deve ser enviada ao Congresso Nacional a proposta para a reforma da Previdência, a menina dos olhos do mercado, e para alguém que foi eleito com as bênçãos da burguesia nacional justamente para, entre outras coisas, avançar em mais esse ataque aos direitos dos trabalhadores que os governos anteriores não haviam sido capazes de levar adiante, um possível fracasso nesse sentido pode tornar Bolsonaro descartável para esse setor. É bom lembrar que ele nunca foi o funcionário preferido da burguesia, mas com o naufrágio das opções tradicionais da direita como Geraldo Alckmin (PSDB), teve de ser engolido a seco.

 

Independentemente do que venha a resultar desta última crise, seja a demissão ou a manutenção de Gustavo Bebianno no governo, a principal tarefa da esquerda socialista, deve ser a luta pela conformação de uma frente única com os trabalhadores e trabalhadoras de luta contra a reforma da Previdência. Nesta quarta-feira (20/02) data prevista para o encaminhamento ao Congresso da proposta do governo, deverá ocorrer na Praça da Sé, em São Paulo, uma Plenária Nacional de trabalhadores organizada de maneira unitária pelas principais centrais sindicais para debater e organizar a luta contra a contrarreforma. Atos e atividades diversas também estão previstas em outros pontos do país, e são um passo importante da organização para as próximas batalhas. Em um momento como esse, era de se esperar que o nosso partido, o PSOL, que nasceu justamente da luta contra a Reforma Previdenciária de Lula em 2003, estivesse à frente da mobilização, utilizando o importante capital político que possui, e a legitimidade conquistada dentro dos movimentos sociais em anos de oposição de esquerda a todos os governos que passaram pelo Planalto desde o seu nascimento, para levar adiante essa luta. Ao invés disso, a sua direção prefere seguir em reuniões de gabinete com partidos ditos de esquerda como PSB, PDT, PCdoB e PT, no chamado “observatório da democracia”.

 

No lugar de fazer a “vigília” da democracia burguesa, o partido que tem suas principais figuras públicas ameaçadas constantemente em pleno “Estado Democrático de Direito” com a cumplicidade de seus agentes, quando as ameaças ou mesmo as execuções não partem justamente de dentro do Estado, deveria discutir como organizar o povo para lutar contra os ataques que virão do governo democraticamente eleito de Jair Bolsonaro e explicar ao povo trabalhador por que ele não é uma opção contra este sistema falido. Ao contrário do que defendeu Freixo quando de sua candidatura à presidência da Câmara, a oposição do PSOL não deve ser pautada pelo republicanismo ou pela defesa democracia, de maneira abstrata. Esse tipo de estratégia leva, cedo ou tarde a conformar blocos políticos com partidos burgueses como parte dos que já foram citados, ou com outros como a Rede Sustentabilidade de Marina Silva, e não ajudam em nada na luta pela independência da casse trabalhadora. A oposição liderada pelo PSOL deveria ser baseada na luta intransigente contra a pauta do governo e na mobilização popular pelo combate a Bolsonaro. Não é a partir de acordos e por dentro de um Congresso desmoralizado diante dos olhos do povo que virá a saída para os nossos problemas, mas das ruas, e é lá que nós queremos nos encontrar com todos aqueles que pretendem ser resistência este governo nefasto.

 

Luiz Domingues (RS) e Lucas Tiné (PE)