33º aniversário de sua morte. Nahuel Moreno e a organização revolucionária



“Vamos lembrar, vamos lembrar, ao companheiro Moreno construindo o partido e a Internacional” cantam os militantes em cada homenagem ao mestre da nossa corrente trotskista e sintetizando nessas poucas palavras a base do seu legado.

Muito se escreveu sobre as contribuições e também sobre os erros de Moreno. Porém, mesmo os piores críticos tiveram que reconhecer que Nahuel construiu um partido revolucionário, profundamente implantado no movimento obreiro, tanto que Ubaldini ficou preocupado com a inserção que na década de 80 nossa organização teve nos órgãos de delegados e nas comissões internas de muitos estabelecimentos.

Moreno dedicou, como ele mesmo disse em uma longa entrevista, a maior parte de sua vida e militância à construção da Internacional, a IV Internacional. Isso foi reconhecido pelo revolucionário belga Ernest Mandel, líder do Secretariado Unificado (SU) da Quarta e talvez um dos líderes trotskistas com quem Moreno mais discutiu: “Com ele desaparece um dos últimos representantes do punhado de quadros principais que, depois da Segunda Guerra Mundial, mantiveram a continuidade da luta de Leon Trotsky. ”(1)

Desde o seu começo: a necessidade de um partido

O jovem Hugo Miguel Bressano Capacete (2) decidiu na década de 40, romper com os círculos intelectuais do trotskismo local, confrontar seu mestre Liborio Justo, mais conhecido como “Quebracho”, e se mudar para o bairro obreiro da Villa Pobladora, em Avellaneda, com um grupo de jovens militantes e fundadores do GOM (Grupo Obreiro Marxista).

“Mas o urgente, o imediato, hoje como ontem é: aproximarmos da vanguarda proletária e rejeitar como oportunista toda tentativa de desviarmos dessa linha, pois está presente como uma tarefa possível”, escreveu no folheto El partido, publicado em 1944. Debatia com aqueles que apoiavam tarefas prévias ou fórmulas que dificultavam a tarefa de se conectar com as lutas obreiras para começar a construir um partido. Traçava assim uma linha divisória entre os intelectuais ou os propagandistas e os militantes revolucionários.

A construção do partido e da Internacional, as ferramentas necessárias para superar a “crise da direção revolucionária”, “da humanidade”, parafraseando o Programa de Transição que Trotsky escreveu em 1938, foi a luta ao qual dedicou sua vida. Em nosso país com diferentes nomes, cuja história excede as possibilidades desta nota, marcam essa trajetória: GOM, POR, Federação Bonaerense da PSRN,  Palavra Obreira, PRT, A Verdade, PST, o velho MAS, foram antecessores do nosso atual MST.

Disputando com as diferentes correntes que nutriam os trabalhadores e a vanguarda de seu tempo: stalinistas, anarquistas, social-democratas, logo nacionalistas burgueses, guerrilheiros, manteve o tempo todo, a decisão de construir um partido revolucionário entre os trabalhadores participando nas suas lutas e nas das classes oprimidas do nosso país. Com um programa que incentivava a mobilização permanente contra os defensores do capitalismo local e do imperialismo, criou uma organização profundamente internacionalista que combinou a maior democracia interna na hora de debater, com a maior disciplina na hora de atuar.

Contra o revisionismo

A construção do partido foi um combate que levou adiante junto a centos de quadros e de milhares de militantes, no campo da construção prática cotidiana e também no debate de ideias. Na IV eles brigaram contra aqueles que negavam à construção de um partido e que queriam mudar o caráter da Internacional.

No Congresso de 1953, a fração liderada pelos líderes Michael Pablo e Ernest Mandel decidiu por um entrismo “decenal” nos partidos comunistas e outras organizações contrárias ao desenvolvimento da Revolução Socialista, com base na previsão de uma terceira Guerra Mundial e de que as velhas organizações traiçoeiras iam mudar sua natureza, abandonando assim a tarefa de construir partido. Depois, terminada a tática do “entrismo”, Mandel se resignou à construção de partidos trotskistas independente dos velhos aparatos, para diluí-los em quantas correntes ou fenômenos “progressista” se apresentassem, se chamava o castrismo, o nacionalismo burguês ou o pequeno burguês com traços do imperialismo.

A Internacional

Hugo sempre afirmou a necessidade para os trotskistas de ser parte da construção de uma internacional revolucionária e seu papel insubstituível. Trotskismo é sinônimo, para o morenismo, de internacionalismo militante. A direção internacional para Moreno, por mais fraca que fosse sempre vai ser mais forte que uma direção nacional. E esta foi a principal batalha da sua vida.

Enfrentou os “Internacionalistas” só de nome, contra os modelos que como o do PO, nunca passaram de alguns grupos menores, satélites, de um partido principal, ou de aqueles como o SU, que terminaram armando uma federação flexível sem intenção de convertê-la em um partido mundial para atuar. Protagonizou um forte debate inclusive contra aliados momentâneos, que como o SWP(3), acompanharam um momento no combate contra a liquidação Mandelista, mas se negaram a trabalhar para construir uma direção alternativa.

Para Moreno o reagrupamento da IV depois de finalizada a Segunda Guerra e sua reunificação logo para a Revolução Cubana, foram realizações muito positivas das quais participou ativamente. Na luta por uma política internacional correta, desenvolveu distintas construções junto a outros dirigentes trotskistas. Diferentes foram os seus nomes e experiências: SLATO, TLT, Fração Bolchevique, CICI, a LIT-CI no seu começo.

Nossa corrente deixou uma marca na história latino-americana com o apoio ao levantamento em Cuzco, que dirigia o então militante da nossa organização Hugo Blanco, na década de 60; fumos parte dos fundadores do PT no Brasil nos anos 80; organizamos a brigada de Simon Bolívar que combateu a revolução Nicaraguense de 1979, entre outras experiências.

Seu legado na atualidade

Moreno morreu antes da caída do Muro de Berlin. Nas três décadas depois da sua morte, muitas coisas aconteceram no mundo. Algumas confirmaram seus ensinamentos, outras mostraram o erro em alguns dos seus prognósticos. A caída do chamado “Socialismo real” liberou o terreno desse aparato contrarrevolucionário mundial, o estalinismo. Mas a falta de uma alternativa revolucionária fez com que o triunfo que significou a caída dos velhos regimes totalitários não pudesse avançar até um socialismo com democracia obreira, e o capitalismo pôde restaurar-se da mão da casta burocrática.

Uma enorme confusão se estendeu pelo movimento de massas mundial, que viu o socialismo associado à monstruosidade burocrática e essa confusão se estendeu a grandes setores da militância anti-estalinista, e da esquerda em geral, incluído o trotskismo, que desenvolveram um forte ceticismo. O “horizontalismo”, a “não disputa de poder”, a identificação dos ensinamentos leninistas com a podridão estalinista, são duras perdas a enfrentar. Os herdeiros de Mandel agora negam a necessidade de construir um partido revolucionário, diluindo as forças trotskistas dentro de “partidos anticapitalistas amplos” que vão sucedendo em fracassos e traições como PODEMOS na Espanha ou SYRIZA na Grécia.

A ofensiva neoliberal da década de 90 não conseguiu esmagar a resistência dos trabalhadores e finalmente, a enorme crise capitalista de 2008 veio para despejar as nuvens, derrubando a mentira que haveria capitalismo por mais um bom tempo. A resposta à avançada super-exploração foi a aparição de levantamentos e revoluções. Em estes meses, cruza o planeta uma importante onda de luta com a juventude na cabeça, desde o Oriente Médio a América Latina, passando por uma grande greve geral Francesa e o levantamento dos Hongkones.

Desde o MST na Liga Internacional Socialista, sustentamos que a melhor maneira de homenagear nosso mestre é defendendo que “O urgente, o imediato, hoje como ontem é: aproximarmos a vanguarda” das lutas para construir com ela grandes partidos Socialistas Revolucionários e a Internacional.


Gustavo Giménez

1. Mensagem de Mandel ao ato de enterro de Nahuel Moreno, janeiro de 1987.
2. Nahuel foi o pseudónimo com que nomeou Liborio Justo e significa “tigre”.
3. Socialist Workers Party: organização do trotskismo norte-americano daquela época.